Estudo mostra como o desmatamento destrói os igarapés e ameaça a água da região
Pesquisadores brasileiros alertam que a perda da vegetação está secando os pequenos rios da Amazônia e colocando em perigo a vida de quem depende deles
REDAÇÃO – Um estudo divulgado na revista Ecosystems mostra que o desmatamento na Amazônia está afetando diretamente os igarapés — pequenos cursos d’água típicos da região. A pesquisa, liderada por Gabriel Martins da Cruz, do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Síntese da Biodiversidade Amazônia (INCT-SinBiAm) e da Universidade Federal do Pará (UFPA), analisou 269 igarapés ao longo de 13 anos na parte oriental do bioma.
Os dados indicam que a retirada da vegetação nas margens e nas bacias de drenagem provoca uma reação em cadeia. A floresta deixa de fornecer matéria orgânica — como folhas e troncos — e o resultado é o acúmulo de areia no fundo dos igarapés, o que desestabiliza o curso da água e compromete todo o ambiente em volta.
Segundo Gabriel, “os igarapés são como veias da floresta. Quando a vegetação das margens desaparece, todo o sistema perde equilíbrio”. Ele também explica que preservar apenas as áreas próximas dos rios não resolve o problema em locais já degradados.
O levantamento aponta a necessidade de cuidar das bacias hidrográficas de forma integrada, envolvendo a proteção tanto das matas ciliares quanto das grandes áreas de floresta. Essa abordagem é essencial para garantir a estabilidade dos igarapés e reduzir o risco de falta d’água, que já é uma realidade em várias partes da Amazônia — região que perdeu 32% das suas águas superficiais nos últimos 35 anos, segundo dados do MapBiomas.
O professor Leandro Juen, orientador da pesquisa, defende que é hora de mudar o foco das ações ambientais. Para ele, os ecossistemas aquáticos continuam esquecidos nas políticas públicas, mesmo sendo afetados por atividades que rebaixam os lençóis freáticos e reduzem a disponibilidade de água. “Recuperar os igarapés é recuperar a base da vida na Amazônia”, afirma.
O estudo também homenageia o ecólogo Robert M. Hughes (1945–2025), referência internacional em ecologia aquática, que colaborou com pesquisas na região.
A pesquisa contou com o apoio de redes científicas como o PPBio Amazônia Oriental, o Biodiversity Research Consortium Brazil–Norway (BRC) e instituições como CNPq, FAPESPA, FAPESP e CAPES.
Os cientistas recomendam que as ações de restauração priorizem a reconexão entre floresta e igarapé, garantindo o sombreamento natural e o retorno da matéria orgânica às águas. O trabalho contribui para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (ODS 6, 13 e 15) e reforça o papel da Amazônia na estabilidade do clima global, um tema central para a COP30.